Dr. Bezerra de Menezes

Escrito por Rogério Magalhães

Bezerra

 

Ao abordarmos a questão das curas espirituais, não podemos esquecer de falar mais detalhadamente de uma grande figura, um grande espírito que viveu entre nós e que hoje atua no plano espiritual para orientar todo um trabalho competente de auxílio médico.

Estamos falando do dr. Bezerra de Menezes, conhecido por muitos como “o médico dos pobres”, um dos nomes mais significativos na história do Espiritismo.

Além de grande médico, Bezerra de Menezes sempre foi um homem de reputação ilibada, um político de atitudes dignas e de grande honradez. Mas, fundamentalmente, foi ao abraçar os pobres necessitados e dividir com eles sua vida e trabalho que a pureza desse espírito de escol aflorou, dando exemplos e mais exemplos de amor e dedicação ao próximo.

Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti nasceu em uma pequena localidade do interior do Ceará, Riacho do Sangue (hoje Jaguaretama), em 29 de agosto de 1831. Aos sete anos, ingressou na escola pública, levando cerca de 10 meses apenas para ficar bem instruído. Aos 11, já cursava humanidades e, aos 13, dava aulas de latim, substituindo a ausência do professor. Por questões de ordem política, sua família se mudou para o Rio Grande do Norte, de onde só regressou em 1846, passando a morar em Fortaleza.

Bezerra de Menezes era filho de Antônio Bezerra de Menezes, um tenente-coronel da antiga Guarda Nacional que legou ao filho toda a sua carga de caráter e honradez. Seu pai tinha um coração muito bom, usando sua grande fortuna para ajudar muitas pessoas, mas diante da exploração de amigos e parentes, o velho coronel viu sua riqueza minguar. Acabou por se tornar um administrador de suas próprias posses, como se fossem apenas “emprestadas”, utilizando o suficiente para manter sua família dignamente.

Foi assim que o coronel teve uma conversa com Bezerra de Menezes, pois sabia do sonho do filho de se formar em medicina. Disse-lhe que não podia, por dever de consciência, usar as posses que tinha para custear sua formação, já que cuidava de seus bens como um verdadeiro empréstimo. Foi essa demonstração de probidade que deu mais ânimo para Bezerra de Menezes lutar como nunca para realizar sua vontade e justificar o merecimento de ter um pai com tamanha nobreza de espírito. Com uma quantia razoável, partiu em 1851 para o Rio de Janeiro, pronto para estudar e se tornar médico.

Com a coragem e a honradez herdadas do pai, Bezerra de Menezes fez de tudo para custear seus estudos. Dava aulas particulares para sustentar suas despesas com moradia e taxas do curso, até que, em 1856, conseguiu o diploma de médico com as melhores notas da faculdade em todo o período que lá passou. Um ano depois, entrou no exército graças à indicação de seu professor, o dr. Manuel Feliciano Pereira de Carvalho, sendo nomeado cirurgião-tenente. E, em 1858, casou-se com Maria Cândida de Lacerda, com quem teve dois filhos.

Apesar das recomendações de seu pai para que não entrasse na política, além de estar atarefado com seus doentes, Bezerra de Menezes foi procurado para que fizesse parte da lista de candidatos a vereador do Partido Liberal (o mesmo partido ao qual seu pai sempre esteve ligado ideologicamente) nas eleições de 1860 . Foi eleito, mas teve seu mandato impugnado por ser integrante do exército. Entretanto, ele não pensou duas vezes para abandonar o cargo militar e poder, assim, assumir sua vaga na Câmara.

Como político, sempre se preocupou em trabalhar para trazer benefícios ao povo que o elegeu. Sempre bateu de frente com o poder, atitude que lhe trouxe problemas tanto com o governo como com integrantes de seu próprio partido, mais interessados em fazer ações convenientes politicamente. Em 1867, Bezerra de Menezes foi eleito deputado pelo Rio de Janeiro, quando então seu nome tomou uma projeção nacional. Porém, com a ascensão do Partido Conservador e a dissolução da Câmara dos Deputados, ele se afastou um pouco da política, retornando somente em 1876, novamente como vereador.

 

O encontro com o Espiritismo

No entanto, o que movia o dr. Bezerra de Menezes era mesmo o trabalho médico, a possibilidade de exercer a caridade e levar a cura para tantos necessitados, sobretudo para aqueles mais pobres e sem condições materiais. Tanto que sua pouca fortuna veio de quando foi detentor da Companhia da Estrada de Ferro Macaé-Campos, o que não durou muito, devido às perseguições governamentais que o levaram a ficar sem recursos financeiros.

Mas Bezerra de Menezes não se preocupava com isso, não era aferrado aos bens materiais. No livro Vida e Obra de Bezerra de Menezes, de Sylvio Brito Soares, temos uma boa idéia de sua vocação para a caridade: “Seu espírito, porém, pairava sempre acima dos bens efêmeros do mundo e tanto isso é verdade que, dispondo de todos os elementos para reconquistá-los, mostrou em todas as horas sua completa indiferença, para se dedicar única e exclusivamente ao exercício de seu sacerdócio médico e repartir a caridade por todos os infelizes”.

O jovem Bezerra de Menezes havia sido criado no seio de uma família católica, porém, chegando ao Rio de Janeiro, passou a deixar de lado essa crença, pois, segundo ele, não era firmada em uma fé raciocinada. Só voltou a se interessar mais por questões religiosas quando sua esposa faleceu, em 1863. De um amigo, recebeu um exemplar da Bíblia, que passou a ler e ficar interessado, mas depois teve a necessidade de crer em algo firmado na razão.

Era uma época em que o Espiritismo começava a ganhar forma, afinal de contas, a codificação da doutrina realizada por Allan Kardec havia acontecido em 1857. Inicialmente, Bezerra de Menezes repudiava as idéias espíritas, por temer que elas desarranjassem os pensamentos que haviam lhe conduzido novamente à religião de sua família. Porém, foi um colega de profissão, o dr. Joaquim Carlos Travassos, quem lhe abriu as portas dessa doutrina consoladora e esclarecedora.

Ao ter em mãos a tradução em português de O Livro dos Espíritos, o dr. Joaquim presenteou Bezerra de Menezes com a obra, gentilmente aceita por este. Certo dia, ao tomar um bonde, o “médico dos pobres” passou a ler o livro para se distrair durante a viagem. Apesar de repudiar o Espiritismo, considerava que deveria ao menos estudá-la, como fazia com outras doutrinas. Ficou tão absorvido com o conteúdo de O Livro dos Espíritos (dizia encontrar ali nada que fosse novo para o espírito, mas novo para ele) que chegou à conclusão de que parecia ser “um espírita inconsciente ou, como se diz vulgarmente, de nascença”, conforme palavras dele mesmo.

Mas foi ao sofrer de dispepsia que Bezerra de Menezes pôde começar a comprovar e se encantar com a doutrina espírita. Ele não conseguia obter melhoras por meio da medicina oficial e, depois de cinco anos de tratamentos infrutíferos, resolveu procurar um médium de nome João Gonçalves do Nascimento. Bezerra não acreditava muito, achava se tratar apenas de um especulador, mas queria também ter uma convicção mais fundamentada sobre o que acabava de conhecer.

Um médico amigo seu é quem foi à presença desse médium e depois, ao ler o que este havia escrito, surpreendeu-se com o teor da mensagem, que trazia uma descrição de quem ele era (apesar de ter se identificado apenas com seu primeiro nome, pouquíssimo conhecido) e do mal que sofria. Em três meses de tratamento espiritual, Bezerra de Menezes estava completamente curado e pronto para voltar a seus afazeres.

Para impressioná-lo ainda mais, tempos depois, sua segunda esposa também ficou seriamente doente, chegaram a condená-la como tuberculosa. Recorreu novamente ao médium, que diagnosticou que o problema estava no útero, o que refletia nos pulmões. Tratada espiritualmente, ela ficou curada e não apresentou mais problemas.

Bezerra de Menezes se sentia um novo homem, havia encontrado no Espiritismo o porto seguro onde aportar, algo em que podia crer depois de tanto procurar. Segundo ele, “não encontrava onde assentar minha crença porque o ensino de Jesus me era oferecido sob um aspecto impossível de se acomodar com um sentimento íntimo, instrutivo, exato, que me desse a razão e a consciência de ali estar a verdade”.

Em 16 de agosto de 1886, diante de cerca de 2 mil pessoas da alta sociedade reunidas no salão da Guarda Velha, o dr. Adolfo Bezerra de Menezes declarava solenemente e cheio de orgulho que havia aderido ao Espiritismo. A partir de então, passou a ser um dos maiores divulgadores e defensores da doutrina em nosso país. Trabalhou incansavelmente para levar a palavra dos espíritos para todos os cantos e todas as pessoas, sobretudo aos enfermos. Lutou contra aqueles que detratavam a doutrina, virando-se contra atos como a condenação das práticas espíritas contida no Código Criminal promulgado quando da proclamação da República. Usava páginas de jornais como O Paiz para publicar seus artigos em favor do Espiritismo, gerando grandes e acalorados debates.

Em 11 de abril de 1900, Adolfo Bezerra de Menezes partiu para o mundo espiritual, causando muita comoção em todos os amigos e admiradores. Sua missão terrena chegava ao fim, mas o trabalho no plano superior tinha muito ainda a se realizar. Bezerra de Menezes passaria a inspirar a divulgação da doutrina e trabalhar para curar espiritualmente muitas almas necessitadas do amor e dedicação que caracterizavam o “médico dos pobres”.

 

Os trabalhos de cura

Quando encarnado, Bezerra de Menezes disse certa feita: “Um médico não tem o direito de terminar uma refeição nem de perguntar se é longe ou perto quando um aflito qualquer lhe bate à porta. O que não acode por estar com visitas, por ter trabalhado muito e se achar fatigado ou por ser alta hora da noite, mau o caminho ou o tempo, ficar longe ou no morro, o que sobretudo pede um carro a quem não tem com que pagar a receita, esse não é médico, é negociante de medicina, que trabalha para recolher capital e juros dos gastos de formatura”.

Sendo assim, nunca teve pudores de cuidar e curar quem quer que fosse, na hora e no lugar que fosse, sempre tendo em mente que “fora da caridade não há salvação”. Trabalhava de graça, levando sua palavra de conforto, seus recursos de médico e sua bolsa de remédios para minorar o sofrimento das pessoas. Medicamentos, aliás, que eram fornecidos gratuitamente na Pharmácia Cordeiro, no Rio de Janeiro, onde costumava fazer seus atendimentos.

Mas ao partir para o plano espiritual, Bezerra de Menezes manteve viva a vontade e a disposição de trabalhar pela cura dos enfermos. Por meio de cirurgias espirituais, traz conforto e saúde para aqueles que tanto necessitam. No livro Lindos Casos de Bezerra de Menezes, de Ramiro Gama, podemos encontrar vários relatos sobre casos de cura promovidos pelo “médico dos pobres”, como este que transcrevemos a seguir:

“Este caso quem nos contou foi o prezado amigo e irmão Manuel Epaminondas, residente em Três Rios, Estado do Rio de Janeiro. Sua sobrinha Luzia se achava atacada há quase dois anos por uma sinusite crônica, segundo o diagnóstico de seu médico assistente. Em meados do ano anterior, 1941, a doença se agravou, complicando-se com outras velhas enfermidades. Seu médico, depois de lançar mão de todos os recursos de sua ciência, desenganou-a, tanto mais que a operação que lhe poderia salvar era contra-indicada, dada sua fraqueza orgânica, que progredia diariamente.

Foi quando, à residência da irmã dele, que residia no Rio nesta época, na qual estava sua sobrinha, chegou uma senhora espírita. Observou a doente desenganada e aconselhou: ‘Por que não levam a Luzia a um grupo espírita e não a tratam pelo Espiritismo? Tenho a intuição de que ficará boa, tanto mais que a medicina da Terra se mostra impotente para curá-la’.

Sua irmã e o cunhado eram católicos, se bem que eram simpáticos à doutrina espírita também, e ficaram indecisos. Mais tarde, apareceram outras visitas que aconselharam a terapêutica espírita.

Dormiram, pois, todos apreensivos com as recomendações. Pela manhã, sua irmã, o cunhado e a própria doente contaram seus sonhos. Eram idênticos. Sonharam os três que o dr. Bezerra de Menezes havia lhes aparecido e dito: ‘O caso é de operação. Amanhã, no fim da tarde, às 18h, concentrem-se porque vou operá-la. Tenham fé em Jesus’.

A perplexidade era geral. Então o caso era mesmo sério e haveria de dar bom resultado. Confiaram e esperaram. Neste interim, entra a senhora espírita que os visitara na véspera e os aconselhara a procurar um grupo espírita, contando-lhes: ‘Esta noite sonhei com Luzia e o dr. Bezerra. Ouvi nitidamente ele dizer que vai operá-la hoje à tarde’.

Era demais. A comoção invadiu a todos. A graça lhes parecia além de seus merecimentos. E à tarde, às 18h, de acordo com as recomendações do dr. Bezerra de Menezes nos quatro sonhos, concentraram-se. Oraram com respeito e emoção. A doente foi colocada na cama e esperaram todos, temerosos, apreensivos.

Daí em diante, a enferma dormiu para acordar minutos depois, gritando emocionadíssima: ‘Fui operada por um velhinho de branco, que aqui esteve, fez-me dormir e, depois, senti que me operava, que abria minha testa e limpava. Despediu-se me abraçando e ouvi que dizia: vão lhe aparecer na testa algumas feridinhas, mas não se incomode, depressa desaparecerão e depois você ficará completamente curada. Dê graças a Deus! Eleve seu coração para Jesus, o divino médico do corpo e da alma, que, por intercessão de Maria Santíssima, permitiu a operação. E partiu’.

Isto se deu, concluiu nosso caro amigo Nonda, há 17 anos e sua sobrinha Luzia se acha hoje completamente curada. Tudo se realizou como o dr. Bezerra lhe disse, pequenas feridas apareceram-lhe na testa e, depois, desapareceram como que por encanto”.

Para concluir, vejamos as palavras de Sylvio Brito Soares, em seu livro Vida e Obra de Bezerra de Menezes, sobre o “médico dos pobres”: “Bezerra de Menezes é, para todos os que mourejam em terra do “coração do mundo”, a âncora de salvação quando a borrasca do infortúnio os atinge. Milhões de vozes pedem diariamente seu socorro. Milhões de corações a todo instante agradecem a esse grande benfeitor as dádivas de seu amor. Bezerra de Menezes vive nos corações de todos os espiritistas do Cruzeiro do Sul”.

 

Artigo publicado na Revista Cristã de Espiritismo, edição especial 02.

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