“Não junteis tesouros na terra, onde a ferrugem e a traça os
consomem, e os ladrões os desenterram e roubam, mas acumulai
para vós tesouros no Céu, onde não os consomem a ferrugem nem
a traça, e onde os ladrões não os desenterram nem roubam,
porque, onde está o teu tesouro, aí está também o teu coração.
”
(Mateus, 6:19 a 21.
)
Assim exortava Jesus aos judeus da época, cuja ganância do
dinheiro era de tal forma obcecante que os fazia esquecer os
preceitos da religião.
A situação, hoje, parece ser a mesma.
As riquezas continuam
exercendo tão fascinante influência na vida que os homens,
sufocando ou pervertendo o que há em si de mais nobre e belo,
deixam-se absorver por elas, abstraindo-se por completo das
coisas celestiais.
Não se creia, conforme pode parecer, que Jesus condene as
riquezas.
O que Ele recomenda é que nos não escravizemos a elas,
nem façamos de sua posse a finalidade exclusiva de nossa
existência; pois, sendo transitórias, deixá-las tornar-se-ia uma
tortura para os nossos corações.
Ensinando: “ajuntai para vós tesouros no céu”, quis o Mestre
dizer-nos que desenvolvamos as boas qualidades da alma: a
caridade, a justiça, a misericórdia, a tolerância, enfim, o amor
fraterno para com todos, pois em tal consistem as riquezas
imperecíveis, realmente nossas, que as traças e a ferrugem não
podem corromper, nenhum incêndio ou inundação pode destruir,
e ladrão algum pode arrebatar.
A riqueza, quando utilizada de conformidade com a vontade
divina, é o mais poderoso recurso para ativar a evolução e o bemestar
da Humanidade, pois dá serviço aos que dele precisam e
contribui para o desenvolvimento da inteligência humana, por
meio das Artes e das Ciências.
Se ela fosse repartida igualmente com todas as criaturas, di-lo
Kardec, cada um, supondo ter com que viver sem trabalho,
procuraria eximir-se dele, resultando daí o mal de todos pela
paralisação do progresso e pela falta dos elementos indispensáveis
à existência.
Deus a concede, então, a limitado número de pessoas, para que
elas a administrem com critério e integridade, fazendo chegar aos
demais o bastante para cobrir as suas necessidades.
A riqueza é, ainda, o meio que Deus faculta aos seus detentores
para que melhor aprendam a discernir o bem do mal e o pratiquem
em grande escala, em proveito da coletividade.
Sendo, entretanto, materialmente impossível que todos a usem
ao mesmo tempo, cada um a possuirá por sua vez.
Quem não a
possui hoje, já a teve, ou virá a tê-la em outra encarnação, e quem
a possui agora, poderá não a ter amanhã.
Se tivéssemos uma única existência, não se explicaria tal
divisão de bens; vivemos, porém, muitas e muitas vezes, e é à luz
desta verdade que se afirma o equilíbrio da Justiça Divina.
Muitos queixam-se, e com razões de sobejo, do péssimo uso
que alguns fazem da riqueza, chegando, por isso, a duvidar da
sabedoria suprema que conduz todas as coisas.
Importa deixá-los, pois ninguém zomba impunemente das Leis
de Deus.
Ai daqueles que, possuindo fortuna, não a põem em
movimento, deixando, assim, de proporcionar trabalho ao povo!
Ai daqueles que, possuindo haveres em abundância, só cogitam
de aumentá-los, aumentá-los sempre, negando-se a atender aos
reclamos dos que, premidos pela necessidade, imploram um
pouco mais de pão!
Ai daqueles que, vivendo na opulência, só cuidam de suas
satisfações pessoais, sem se lembrarem, jamais, dos que sofrem os
horrores da fome, dos que sentem os rigores do frio e dos que não
têm onde repousar o corpo exausto e combalido pela enfermidade
ou pela velhice!
A eles aplica-se aquela sentença de Jesus: “É preciso que haja
o escândalo; ai daqueles, porém, por causa de quem vier o
escândalo”, o que equivale a dizer: É preciso que haja o
sofrimento, porque é no cadinho da dor que se depuram os nossos
sentimentos.
Ai, porém, daqueles que o provocam! Ai daqueles
que o semeiam!
A morte, para esses, não será a paz nem a bênção do Céu.
Será
o desassossego e a maldição.
Desassossego pelos acúleos da
própria consciência; maldição das vítimas do seu egoísmo e de sua
insensibilidade!
Atormentados pelo inferno imanente, sentirão a necessidade de
se dirigirem a Deus, suplicando-lhe, por misericórdia, avatares
expiatórios e redentores.
Não invejemos, pois, os ricos e poderosos da Terra.
Se a pobreza é a prova da paciência e da resignação, a riqueza
constitui a prova do altruísmo e da caridade — bem mais difícil
de vencer!