RIQUEZAS – Rodolfo Calligaris – O Sermão da Montanha

“Não junteis tesouros na terra, onde a ferrugem e a traça os

consomem, e os ladrões os desenterram e roubam, mas acumulai

para vós tesouros no Céu, onde não os consomem a ferrugem nem

a traça, e onde os ladrões não os desenterram nem roubam,

porque, onde está o teu tesouro, aí está também o teu coração.


(Mateus, 6:19 a 21.
)

Assim exortava Jesus aos judeus da época, cuja ganância do

dinheiro era de tal forma obcecante que os fazia esquecer os

preceitos da religião.

A situação, hoje, parece ser a mesma.
As riquezas continuam

exercendo tão fascinante influência na vida que os homens,

sufocando ou pervertendo o que há em si de mais nobre e belo,

deixam-se absorver por elas, abstraindo-se por completo das

coisas celestiais.

Não se creia, conforme pode parecer, que Jesus condene as

riquezas.
O que Ele recomenda é que nos não escravizemos a elas,

nem façamos de sua posse a finalidade exclusiva de nossa

existência; pois, sendo transitórias, deixá-las tornar-se-ia uma

tortura para os nossos corações.

Ensinando: “ajuntai para vós tesouros no céu”, quis o Mestre

dizer-nos que desenvolvamos as boas qualidades da alma: a

caridade, a justiça, a misericórdia, a tolerância, enfim, o amor

fraterno para com todos, pois em tal consistem as riquezas

imperecíveis, realmente nossas, que as traças e a ferrugem não

podem corromper, nenhum incêndio ou inundação pode destruir,

e ladrão algum pode arrebatar.

A riqueza, quando utilizada de conformidade com a vontade

divina, é o mais poderoso recurso para ativar a evolução e o bemestar

da Humanidade, pois dá serviço aos que dele precisam e

contribui para o desenvolvimento da inteligência humana, por

meio das Artes e das Ciências.

Se ela fosse repartida igualmente com todas as criaturas, di-lo

Kardec, cada um, supondo ter com que viver sem trabalho,

procuraria eximir-se dele, resultando daí o mal de todos pela

paralisação do progresso e pela falta dos elementos indispensáveis

à existência.

Deus a concede, então, a limitado número de pessoas, para que

elas a administrem com critério e integridade, fazendo chegar aos

demais o bastante para cobrir as suas necessidades.

A riqueza é, ainda, o meio que Deus faculta aos seus detentores

para que melhor aprendam a discernir o bem do mal e o pratiquem

em grande escala, em proveito da coletividade.

Sendo, entretanto, materialmente impossível que todos a usem

ao mesmo tempo, cada um a possuirá por sua vez.
Quem não a

possui hoje, já a teve, ou virá a tê-la em outra encarnação, e quem

a possui agora, poderá não a ter amanhã.

Se tivéssemos uma única existência, não se explicaria tal

divisão de bens; vivemos, porém, muitas e muitas vezes, e é à luz

desta verdade que se afirma o equilíbrio da Justiça Divina.

Muitos queixam-se, e com razões de sobejo, do péssimo uso

que alguns fazem da riqueza, chegando, por isso, a duvidar da

sabedoria suprema que conduz todas as coisas.

Importa deixá-los, pois ninguém zomba impunemente das Leis

de Deus.

Ai daqueles que, possuindo fortuna, não a põem em

movimento, deixando, assim, de proporcionar trabalho ao povo!

Ai daqueles que, possuindo haveres em abundância, só cogitam

de aumentá-los, aumentá-los sempre, negando-se a atender aos

reclamos dos que, premidos pela necessidade, imploram um

pouco mais de pão!

Ai daqueles que, vivendo na opulência, só cuidam de suas

satisfações pessoais, sem se lembrarem, jamais, dos que sofrem os

horrores da fome, dos que sentem os rigores do frio e dos que não

têm onde repousar o corpo exausto e combalido pela enfermidade

ou pela velhice!

A eles aplica-se aquela sentença de Jesus: “É preciso que haja

o escândalo; ai daqueles, porém, por causa de quem vier o

escândalo”, o que equivale a dizer: É preciso que haja o

sofrimento, porque é no cadinho da dor que se depuram os nossos

sentimentos.
Ai, porém, daqueles que o provocam! Ai daqueles

que o semeiam!

A morte, para esses, não será a paz nem a bênção do Céu.
Será

o desassossego e a maldição.
Desassossego pelos acúleos da

própria consciência; maldição das vítimas do seu egoísmo e de sua

insensibilidade!

Atormentados pelo inferno imanente, sentirão a necessidade de

se dirigirem a Deus, suplicando-lhe, por misericórdia, avatares

expiatórios e redentores.

Não invejemos, pois, os ricos e poderosos da Terra.

Se a pobreza é a prova da paciência e da resignação, a riqueza

constitui a prova do altruísmo e da caridade — bem mais difícil

de vencer!

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