“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o
Reino dos Céus”, disse Jesus (Mateus, 5:3), iniciando o Sermão
da Montanha.
Situou, assim, a humildade espiritual em primeiro lugar, entre
as virtudes que precisamos adquirir para merecermos a glória das
almas redimidas.
Exegetas do Evangelho, adulterando por completo o sentido
dessa máxima, pretendem que ela proclame bem-aventurados os
apoucados de inteligência, os retardados mentais, os idiotas e
imbecis.
Tal interpretação, todavia, é insustentável, pois, a ser
verdadeira, não haveria lugar nos Céus para os ricos de espírito, e
o próprio Mestre, o expoente máximo da riqueza espiritual que a
Terra já conheceu, ficaria de fora.
Por “pobres de espírito”, na acepção em que Jesus empregou
essas palavras, devem-se entender aqueles que, aspirando à
perfeição, e comparando com o ideal a ser atingido o pequenino
grau de adiantamento a que chegaram, reconhecem quanto ainda
são carentes de espiritualidade.
São bem-aventurados porque a noção que têm de suas
fraquezas e mazelas fá-los lutar por aquilo que lhes falta, e esse
redobrar de esforços leva-os realmente a conseguirem maior
progresso espiritual.
Já aqueles que se acomodam a ínfimos padrões de moralidade,
ou se mostram satisfeitos com seu estado, considerando-se
suficientemente bons, ao contrário dos primeiros, não se incluem
entre os bem-aventurados porque, seja por ignorância, seja por
orgulho, permanecem estacionários, quando a vida espiritual,
assim como tudo na Natureza, rege-se por um impulso constante
para a frente e para o alto!
Igualmente, os que entendem não ser preciso cultivar um
caráter nobre e reto, porque (segundo julgam) “o sangue do Cristo
foi derramado para remir os pecados da Humanidade”, também
não são incluídos entre aqueles cuja atitude de espírito foi exaltada
pelo Nazareno.
Malgrado a respeitabilidade de seus princípios religiosos, só
vislumbrarão o Reino celestial quando venham a reconhecer a
pobreza de suas virtudes, e se empenhem com afinco para
conquistá-las, pois todo aquele a quem o Cristo haja redimido, de
fato, terá de deixar as más obras, para “apresentar-se santo,
imaculado e irrepreensível diante dele”.
(Colossenses, 1:22.
)
A colocação da humildade de espírito, como a primeira das
beatitudes, parece-nos, pois, não ser meramente fortuita, mas sim
proposital, visto que a felicidade futura de cada indivíduo depende
muito do conceito que ele faça de si mesmo.
Quem se imagina com perfeita saúde não se preocupa com ela,
nem procura um médico para tratá-la.
Também aquele que se
presume sem defeitos, ou já se considera salvo, descuida da
higidez de sua alma, e, quando menos espere, a morte o
surpreenderá sem que tenha avançado pelo menos um passo no
sentido da realização espiritual.